Transtorno da Compulsão Alimentar Periódica – TCAP

O transtorno da compulsão alimentar periódica (TCAP) foi descrito pela primeira vez nos anos 1950 por Stunkard (1959). Contudo, sua elevação à categoria diagnóstica apenas ocorreu em 1994, quando foi incluído no apêndice B do DSM IV (Apa,1994), sob a forma de transtorno que necessita de maiores estudos para melhor caracterização. Assim, desde então, ocorreu um maior interesse em pesquisas nesta área, diferenciando um subgrupo de pacientes obesos com características alimentares específicas (Zwaan,1997). Além disso, parece que os níveis de psicopatologia exibidos pelos pacientes com TCAP estão associados ao número de episódios de compulsão alimentar (Hay, 1998).

É restrito o número de estudos e pesquisas que avaliam e caracterizam o comportamento alimentar no TCAP, todavia algumas questões parecem comuns. Por exemplo:

– Geralmente o início do quadro de TCAP ocorre no final da adolescência ou no início dos 20 anos, apresentando as mulheres uma probabilidade 1,5 vezes maior de desenvolver este distúrbio em comparação aos homens. 
– Em relação ao padrão alimentar, é comum que o número de refeições planejadas seja reduzido e ocorra omissão do desjejum e de lanches, com grandes intervalos entre as refeições beliscadas e não planejadas e com maior frequência de episódios compulsivos à tarde e à noite. Tal padrão alimentar coincide com o do paciente obeso sem TCAP, contudo, muitas vezes, é descrito com maior intensidade; 
– A alimentação varia entre tudo e nada, com momentos de consumo alimentar excessivo seguido de consumo insuficiente, ainda que de maneira menos acentuada em comparação aos pacientes com bulimia nervosa; 
– Existe aparentemente uma preferência pelo consumo de alimentos ricos em carboidratos, com alto índice glicêmico, alimentos de alta palatabilidade e de fácil ingestão. Dessa forma, o consumo de gorduras é acentuado (em especial gorduras saturadas e trans) e o de fibras, vitaminas e minerais, restrito; 
– As atitudes alimentares no TCAP abrangem pensamentos negativos, obsessão pela comida e autoavaliação focada no controle de ganho de peso e na figura ou aspecto físico, o que reduz a autoestima e pode levar a aumento da fome; 
– A maneira de se comportar geralmente é confusa, com ausência de planejamento de horários, rotinas e local das refeições; 
– Na maioria das vezes ocorre compra excessiva de alimentos, desorganização no armazenamento dos mesmos e, mesmo diante a compra descontrolada de alimentos acontece à monotonia alimentar; 
– A atitude em relação ao alimento parece estar relacionada à dimensão dos episódios, sendo que, quanto mais desordenada a postura, maior o número e extensão dos acontecimentos compulsivos; 
– É corriqueiro o relato de várias experiências de perda de peso e a alimentação solitária, escondida, realizada com rapidez, com mastigação imprópria e, consequentemente sem percepção dos sinais de saciedade; 
– Existe uma desatenção ao comer e este ato de alimentação automática leva ao comer sem saborear o alimento; 
– As emoções e sentimentos relacionados à alimentação são subjetivos e apresentam uma imensa associação com a sensação de perda de controle; 
– O alimento pode ser utilizado como importante recompensa em relação a outros problemas e torna favorável a sensação de prazer exagerado no consumo alimentar, seguida de sentimentos de angústia, vergonha, repugnância ou culpa; 
– Os episódios de compulsão alimentar podem envolver o consumo de grande quantidade de alimentos, com perda de controle em um episódio específico ou, ainda, o consumo repetido de quantidades moderadas de alimentos com perda de controle, ou seja, o indivíduo não consegue parar de comer. Estes devem ocorrer no mínimo dois dias por semana por um período de 6 meses; 
– Apresentam uma maior prevalência de depressão, abuso de drogas e distúrbio de personalidade. Além disso, alguns indivíduos também apresentam a Síndrome Alimentar Noturna (SAN). E como medidas de intervenção, vários desses pacientes, procuram a cirurgia bariátrica.

Critérios de Diagnóstico

Os critérios diagnósticos do TCAP, segundo o DSM-IV, são:

– Episódios recorrentes de compulsão periódica. Um episódio de compulsão periódica é caracterizado por ambos os seguintes critérios: 
– Ingestão, em um período limitado de tempo (por ex., dentro de um período de 2 horas), de uma quantidade de alimento definitivamente maior que a maioria das pessoas consumiria em um período similar, sob circunstâncias similares; 
– Um sentimento de falta de controle sobre o consumo alimentar durante o episódio (por exemplo, um sentimento de não conseguir parar ou controlar o que ou quanto se está comendo). 
– Os episódios de compulsão periódica estão associados a três (ou mais) dos seguintes critérios: 
– Comer muito mais rapidamente que o normal. – Comer até sentir-se incomodamente repleto. 
– Ingerir grande quantidade de alimentos, quando não fisicamente faminto. 
– Comer sozinho, em razão do embaraço pela quantidade de alimentos que consome. 
– Sentir repulsa por si mesmo, depressão ou demasiada culpa após comer excessivamente. 
– Acentuada angústia relativa à compulsão periódica 
– A compulsão periódica ocorre, em média, pelo menos 2 dias por semana, durante 6 meses. 
– A compulsão periódica não está associada ao uso regular de comportamentos compensatórios inadequados, nem ocorre exclusivamente durante o curso de anorexia nervosa ou bulimia nervosa.

Em relação aos itens listados no critério de diagnóstico algumas observações são necessárias:

– Critério A: neste é definindo o conceito de episódio de compulsão alimentar; 
– Critério B: aborda os sintomas associados ao comportamento alimentar confuso; 
– Critério C: determina o sofrimento psíquico relacionado à perda do controle alimentar. Ao contrário do encontrado para o diagnóstico de bulimia nervosa, no qual o critério temporal é determinado como dois episódios de compulsão alimentar por semana durante pelo menos três meses, o TCAP é caracterizado como ocorrendo pelo menos dois dias na semana por no mínimo seis meses (Critério D).

Considerações Importantes

– É importante que a família, algum integrante, participe da anamnese subjetiva, pois algumas vezes o paciente omite informações fundamentais acerca do transtorno. Mas deve-se ter cautela durante este procedimento, uma vez que tal participação pode constranger o paciente, tornando o tratamento ainda mais difícil. O profissional deve usar de sua sensibilidade para identificar se este ato está forçando o seu paciente a agir contrariamente à sua vontade. 
– Nestas situações ou em determinados pacientes, alguns outros sintomas psiquiátricos podem estar presentes, como os transtornos depressivos, ansiosos, bem como abuso de álcool e de outras substâncias psicoativas.

Adriana Lopes Peixoto – Nutricionista

Referência

AZEVEDO, Alexandre Pinto de; SANTOS, Cimâni Cristina dos and FONSECA, Dulcineia Cardoso da. Transtorno da compulsão alimentar periódica. Rev. psiquiatr. clín. [online]. 2004, vol.31, n.4 [cited 2019-10-31], pp.170-172.